sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

Texto Referencial para o Eixo 3

Eixo – Promoção do Livro e Leitura

     I.        Democratização do acesso
    II.        Fomento à leitura e à formação de mediadores
   III.        Valorização do livro e comunicação

O Brasil chega ao século XXI, momento em que a difusão do audiovisual assume imensas proporções, ainda com enorme déficit no que diz respeito às práticas leitoras dos textos escritos. Nossos índices de alfabetização (stricto e lato sensu) e de consumo de livros são ainda muito baixos, na comparação com parâmetros de países mais ricos e desenvolvidos e mesmo com alguns dos países em desenvolvimento da América Latina e da Ásia. Como têm apontado alguns de nossos mais expressivos pensadores no campo das Ciências Humanas, entre eles Nelson Werneck Sodré, o Brasil passou abruptamente de um estágio de oralidade para a cultura do audiovisual, já desde meados do século XX, quando a indústria cultural se fez onipresente entre nós, sem que houvesse efetiva mediação dos livros e materiais de leitura uma vez que esta nunca chegou a alcançar largas faixas da população, restringindo-se a pequenos e localizados grupos sociais.

As conseqüências desse hiato fazem-se sentir até hoje, com desdobramentos nefastos que se espraiam não apenas no âmbito do universo da cultura e da educação, mas, naturalmente, de nossa economia, de nossas práticas políticas e de nosso potencial de desenvolvimento. Diversas pesquisas, realizadas nos últimos anos, têm-se empenhado em apresentar contornos mais nítidos do cenário em que se insere a questão da leitura e do livro no país, permitindo maior consciência das mazelas que afligem o setor e oferecendo dados concretos para que se possa buscar sua superação. É o caso, por exemplo, do Mapa do Alfabetismo no Brasil (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP/MEC, 2003), do Indicador Nacional do Alfabetismo Funcional – INAF (2001 e 2005), do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica – SAEB (2001 e 2003), do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes – PISA (2000) e do Retrato da Leitura no Brasil – CBL/Snel (2001).

De acordo com o Mapa do Alfabetismo no Brasil (INEP, 2003), a evolução da taxa de analfabetismo da população de 15 anos ou mais, no País, diminuiu de 65,3%, em 1900, para 13,6%, em 2000, realizando grande avanço neste campo ao longo do século passado. Apesar desse avanço, entretanto, o Brasil ainda possuía, em 2000, cerca de 16 milhões de analfabetos absolutos (pessoas que se declararam incapazes de ler e escrever um bilhete simples) e 30 milhões de analfabetos funcionais (pessoas de 15 anos ou mais, com menos de quatro séries de estudos concluídas).

Com base nesses dados, o INEP concluiu que, se foi possível reverter o crescimento constante do número de analfabetos a partir de década de 1980, o número absoluto de analfabetos em 2000 ultrapassou o dobro do que havia em 1900. E o dado mais estarrecedor, talvez, apontado pela pesquisa, é o de que 35% dos analfabetos brasileiros já freqüentaram a escola.

Com outra abordagem sobre o analfabetismo, os dados de uma das mais relevantes pesquisas sobre o assunto, denominada Indicador Nacional de Alfabetismo Funcional – INAF-2001, realizada pelo Instituto Paulo Montenegro (Ibope pela Educação), definiu três níveis de alfabetismo de acordo com as habilidades demonstradas pelos entrevistados no teste aplicado. O resultado do INAF 2001 classificou 9% dos entrevistados como analfabetos absolutos; 31% foram classificados no nível 1 (rudimentar) de alfabetismo, pois conseguem apenas ler títulos ou frases, localizando informações bem explícitas; 34% foram classificados no nível 2 (básico) de alfabetismo, pois são aqueles que conseguem ler textos curtos, localizando informações explícitas ou que exijam pequena inferência; e 26% foram classificados no nível 3 (pleno) de alfabetismo, correspondendo àquelas pessoas capazes de ler textos mais longos, localizar e relacionar mais de uma informação, comparar vários textos, identificar fontes.
O INAF 2005 atualiza a pesquisa realizada quatro anos antes e demonstra que, ainda que se verifique tendência de diminuição do nível 1 (analfabetismo absoluto) e aumento dos que atingem o nível 2 de alfabetismo (básico), a situação dos entrevistados que atingem o nível 3 (pleno) de habilidade não teve evolução significativa, mantendo-se próximo a um quarto da população estudada. Ou seja, apenas um em cada quatro jovens e adultos brasileiros consegue compreender totalmente as informações contidas em um texto e relacioná-las com outros dados. Configura-se, assim, um quadro perverso de exclusão social, que deixa à margem do efetivo letramento cerca de três quartos da população brasileira.

Deve-se enfatizar que, de acordo com os especialistas, uma das principais causas do elevado índice de alfabetismo funcional e das dificuldades generalizadas para a compreensão vertical da informação escrita se localiza na crônica falta de contato com a leitura, sobretudo entre as populações mais pobres. Como os investimentos para combater o analfabetismo têm sido crescentes nos últimos anos, isso equivale a dizer que ao mesmo tempo em que milhões de brasileiros ingressam a cada ano na categoria de leitores em potencial, outros milhões saem pela porta dos fundos – a do alfabetismo funcional. Assim, um formidável conjunto de esforços, energia e investimentos públicos e privados não se realizam plenamente, não atingindo suas finalidades.

É importante observar que, embora nas sociedades atuais a leitura seja imprescindível para o ingresso no mercado de trabalho e para o exercício da cidadania, no Brasil as pesquisas e as avaliações educacionais apontam para a precária formação de um público leitor e revelam as imensas dificuldades para o sucesso das ações envolvidas na solução do problema. Se, por um lado, o sistema educacional brasileiro incluiu os estudantes que estavam fora da escola, por outro, essa inclusão não foi plena, do ponto de vista qualitativo, porque o desempenho dos alunos, revelado em instrumentos de avaliação como o SAEB ou o PISA, tem sido baixo, demonstrando sérios problemas no domínio da leitura e da escrita e o aprofundamento das desigualdades.

O Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica – SAEB, desenvolvido pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP/MEC) a partir de 1990, aplica, a cada biênio, exames bienais de proficiência em Matemática e em Língua Portuguesa (leitura) em uma amostra de estudantes de 4ª e 8ª séries do Ensino Fundamental e de 3ª série do Ensino Médio, nas redes de ensino pública e privada, em todas as regiões do país. No geral, os resultados da avaliação têm mostrado sistemática queda no desempenho dos estudantes em quase todas as regiões, revelando sérios impasses da escola brasileira. O SAEB-2001 revela que 59% dos estudantes da 4ª série do Ensino Fundamental ainda não desenvolveram as competências básicas de leitura, ou seja, não conseguem compreender os níveis mais elementares de um texto. Sob outro prisma, a mesma avaliação aponta um desempenho superior de 20% nas escolas em que a prática da leitura é mais constante entre os alunos. Tais dados do SAEB-2001 são também reforçados pela avaliação das habilidades de leitura dos alunos de 8ª série do Ensino Fundamental realizada no SAEB-2003: 4,8% classificam-se em um estágio muito crítico, 20,1% em um estágio crítico e 64,8% em um estágio intermediário.

Também o Relatório do PISA-2000, Programa Internacional de Avaliação de Estudantes da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômicos, reitera os dados mostrados pelo SAEB. O Brasil foi o último colocado na avaliação sobre o letramento em leitura obtido por jovens de 15 anos de 32 países industrializados naquele Relatório nessa pesquisa em que o conceito de leitura em pauta não se resume à noção muito freqüente de mera decodificação e compreensão literal de textos escritos, mas à capacidade de o jovem compreender e utilizar textos de variada natureza para alcançar seus objetivos, desenvolvendo conhecimentos e participando ativamente da sociedade. Daí porque a expressão letramento foi escolhida para refletir a complexidade das variáveis em jogo, a amplitude de conhecimentos, habilidades e competências em causa, procurando-se verificar a operacionalização de esquemas cognitivos em termos de: conteúdos ou estruturas do conhecimento que os alunos precisam adquirir em cada domínio; processos a serem executados; contextos em que esses conhecimentos e habilidades são aplicados.

Em uma avaliação sofisticada como o PISA, destaca-se ainda mais o péssimo desempenho dos alunos brasileiros, próximos do final da escolaridade obrigatória, revelando que não estão preparados para enfrentar os desafios do conhecimento nas complexas sociedades contemporâneas. Uma performance dessa natureza acarreta prejuízos de toda ordem. A baixa competência de leitura não apenas influi no desenvolvimento pessoal e profissional dos estudantes como também, e até por isso, contribui decisivamente para ampliar o gigantesco fosso social existente em países como o Brasil, promovendo mais exclusão e menos cidadania.

Na pesquisa Retrato da leitura no Brasil, ainda precária e insuficiente, mas a maior investigação já feita no Brasil sobre leitura fora de uma perspectiva prioritariamente “escolar” (com leitores com idade igual ou superior a 14 anos e o mínimo de três anos de escolaridade), realizada em 2001 pela Câmara Brasileira do Livro (CBL), Sindicato Nacional dos Editores de Livros (Snel) e Associação Brasileira dos Editores de Livros (Abrelivros), outros tópicos significativos sobre a situação da leitura no país são enfatizados. Um aspecto capital apontado pela pesquisa é o de que o brasileiro lê em média 1,8 livro por ano, índice muito baixo, se comparado ao de países como a França (7,0), os Estados Unidos (5,1), a Inglaterra (4,9) ou a Colômbia (2,4). E esse índice se revela ainda mais crítico quando a pesquisa demonstra que a penetração do livro no país e o acesso a esse objeto cultural são ainda bastante restritos, concentrando-se o mercado comprador de livros nas mãos de 20% da população alfabetizada com 14 anos ou mais, na Região Sudeste, nas grandes cidades e metrópoles, nos estratos de renda mais elevada (classe A) e com instrução superior.

Outro dado dos mais preocupantes, apontado pela pesquisa, é o que mostra que apenas 50% dos livros de leitura corrente foram comprados, em contraposição a 8% pertencentes às bibliotecas e 4% dados pela escola. Ora, o raso acesso a livros em escolas e bibliotecas somadas ao baixo poder aquisitivo da absoluta maior parte dos leitores, propicia efetivamente alternativas escassas para que se concretize a leitura. E é preciso sublinhar que o acesso às bibliotecas é pequeno, não apenas por uma questão cultural que remonta a nossa longa história de iletramento, mas porque a rede de bibliotecas no país é reduzida, seja em termos quantitativos, seja em um plano qualitativo. Ainda assim, conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), na Munic 2003, a biblioteca é um dos equipamentos culturais mais importantes do Brasil, presente em cerca de 85% das cidades brasileiras, em suas modalidades de bibliotecas públicas municipais, escolares e comunitárias. Mesmo assim, cerca de 630 municípios brasileiros ainda não têm biblioteca pública e grande parte das existentes possui equipamentos precários, acervos ínfimos e/ou muito defasados e recursos humanos despreparados para um processo de mediação eficiente na formação de leitores.

Não se pode deixar de lembrar, ainda, que, associado à forte concentração do público consumidor de livros segundo critérios geográficos, de classe social e de nível educacional – como apontou a pesquisa –, há um déficit considerável de livrarias no país. Existem pouco mais de 2.400 livrarias no Brasil, quando o ideal, segundo, os especialistas, seria por volta de 10.000 para nosso contingente populacional. Além disso, a distribuição das livrarias é extremamente desigual, se considerarmos que 89% dos municípios não possuem nenhuma livraria. E, paradoxalmente, deve ser frisado que esse cenário desolador se insere no contexto de um país que é o oitavo produtor de livros do mundo, com um poderoso e atualizado mercado editorial, que conta com mais de 2.000 editoras e movimentam mais de 12.000 títulos e 300 milhões de exemplares publicados anualmente.

Princípios norteadores

O conjunto de dados aqui evocado, se bem que constitua apenas um esboço da questão da leitura e do livro no país, oferece elementos suficientes para contextualizar e justificar a proposição de um Plano como este, dada a gravidade da situação apontada e a premência de sua superação. Mas, para que se delineie com mais precisão o contexto em que se insere a Política de Estado aqui defendida, é importante, ainda, explicitar alguns pressupostos básicos sobre os quais se assenta o Plano, uma vez que correspondem a uma tomada de posição conceitual em relação à leitura e ao livro, e, particularmente, traduzem o horizonte das muitas contribuições absorvidas pelo Plano no amplo fórum que se instaurou para a discussão do tema:

UNESCO

O Plano valoriza particularmente três fatores qualitativos e dois quantitativos identificados pela Unesco como necessários para a existência expressiva de leitores em um país.

Os fatores qualitativos são:

a)    O livro deve ocupar destaque no imaginário nacional, sendo dotado de forte poder simbólico e valorizado por amplas faixas da população;
b)    Devem existir famílias leitoras, cujos integrantes se interessem vivamente pelos livros e compartilhem práticas de leitura, de modo que as velhas e novas gerações se influenciem mutuamente e construam representações afetivas em torno da leitura; e
c)    Deve haver escolas que saibam formar leitores, valendo-se de mediadores bem formados (professores, bibliotecários) e de múltiplas estratégias e recursos para alcançar essa finalidade.

Os fatores quantitativos são:

a)    Deve ser garantido o acesso ao livro, com a disponibilidade de um número suficiente de bibliotecas e livrarias, entre outros aspectos; e
b)    O preço do livro deve ser acessível a grandes contingentes de potenciais leitores.
Além disso, é importante frisar que esse destaque à leitura e ao livro está estreitamente associado à questão geral da competência em informação (information literacy) e do aprendizado ao longo da vida, aspectos que têm merecido especial atenção por parte da Unesco em diretrizes e políticas mundiais para os próximos anos. Sob essa perspectiva, a competência em informação encontra-se no cerne do aprendizado ao longo da vida, constituindo direito humano básico em um mundo digital, necessário para promover o desenvolvimento, a prosperidade e a liberdade – no âmbito individual e coletivo – e para criar condições plenas de inclusão social.

Práticas sociais

A leitura e a escrita são encaradas aqui como práticas essencialmente sociais e culturais, expressão da multiplicidade de visões de mundo, esforço de interpretação que se reporta a amplos contextos; a leitura e a escrita são duas faces diferentes, mas inseparáveis, de um mesmo fenômeno.

Cidadania

A leitura e a escrita constituem elementos fundamentais para a construção de sociedades democráticas, baseadas na diversidade, na pluralidade e no exercício da cidadania; são direitos de todos, constituindo condição necessária para que possam exercer seus direitos fundamentais, viver uma vida digna e contribuir na construção de uma sociedade mais justa.

Diversidade cultural

A leitura e a escrita são, na contemporaneidade, instrumentos decisivos para que as pessoas possam desenvolver de maneira plena seu potencial humano e caracterizam-se como fundamentais para fortalecer a capacidade de expressão da diversidade cultural dos povos, favorecendo todo tipo de intercâmbio cultural; são requisitos indispensáveis para alcançar níveis educativos mais altos; apresentam-se como condição necessária para o desenvolvimento social e econômico. A leitura e o livro são vistos neste plano, não apenas em uma dimensão educacional, mas também, em uma perspectiva cultural, na qual se reconhecem três dimensões trabalhadas pela atual gestão do Ministério da Cultura. A política cultural em voga no Brasil parte de uma perspectiva sistêmica, que se desdobra em três dimensões, as quais são absorvidas por este plano para o setor de livro e leitura: a cultura como valor simbólico, a cultura como direito de cidadania e a cultura como economia. Não há preponderância de uma dimensão sobre a outra, embora os focos da acessibilidade e do valor simbólico contemplem, mais definidamente, as dimensões educacionais (direito de cidadania) e culturais da leitura. A dimensão econômica deve, assim, estar equilibrada por essas duas outras, gerais e geradoras de bens públicos.

Construção de sentidos

A concepção de leitura focalizada pelo Plano é aquela que ultrapassa o código da escrita alfabética e a mera capacidade de decifrar caracteres, percebendo-a como um processo complexo de compreensão e produção de sentidos, sujeito a variáveis diversas, de ordem social, psicológica, fisiológica, lingüística e outras; uma perspectiva mecanicista da leitura, que pretende reduzir o ato de ler a mera reprodução do que está no texto, tem sido um dos mais graves obstáculos para o desenvolvimento da leitura e da escrita. A leitura configura um ato criativo de construção de sentidos, realizado pelos leitores a partir de um texto criado por outro(s) sujeito(s).

O verbal e o não-verbal

Ao reafirmar a centralidade da palavra escrita, não se desconsidera a validade de outros códigos e linguagens, as tradições orais e as novas textualidades que surgem com as tecnologias digitais.

Tecnologias e informação

No contexto atual, é imperativo que a leitura seja tratada no diálogo com as diversas tecnologias de gravação, entre os quais o livro se encontra; como defende Renato Janine Ribeiro, a maneira adequada de difundir a leitura no Brasil não é a de sua “tradição”, mas aquela que considera que o sujeito contemporâneo só consegue ser interativo com a mídia sendo, ele mesmo, “multimeios”, necessitando
da leitura para sê-lo; no mundo de hoje, não apenas a prática leitora deve passar pelo uso das tecnologias de informação e comunicação, mas o usuário dessas tecnologias deve desenvolver, por intermédio da família, da escola e de uma sociedade leitora, a prática de leitura. Neste sentido, atenta para as questões contemporâneas a cerca dos direitos autorais, fortemente impactados pelas novas possibilidades tecnológicas e seus avanços em termos de possibilidade de gravação e cópia. O Plano Nacional de Livro e Leitura defende uma perspectiva contemporânea do livro e da leitura e propõe um diálogo fecundo com as novas licenças de copyrights-não restritivos, no que esses ajudam a equilibrar os direitos de autor, com os direitos de acesso.

Biblioteca enquanto dínamo cultural

A biblioteca não é concebida aqui como um mero depósito de livros, como muitas vezes tem-se apresentado, mas assume a dimensão de um dinâmico pólo difusor de informação e cultura, centro de educação continuada, núcleo de lazer e entretenimento, estimulando a criação e a fruição dos mais diversificados bens artístico-culturais; para isso, deve estar sintonizada com as tecnologias de informação e comunicação, suportes e linguagens, promovendo a interação máxima entre os livros e esse universo que seduz as atuais gerações.

Literatura

Entre as muitas possibilidades de textos que podem ser adotados no trabalho com a leitura, a literatura merece atenção toda especial no contexto do Plano, dada a enorme contribuição que pode trazer para uma formação vertical do leitor, consideradas suas três funções essenciais, como tão bem as caracterizou Antonio Candido: a) a capacidade que a literatura tem de atender à nossa imensa necessidade de ficção e fantasia; b) sua natureza essencialmente formativa, que afeta o consciente e o inconsciente dos leitores de maneira bastante complexa e dialética, como a própria vida, em oposição ao caráter pedagógico e doutrinador de outros textos; c) seu potencial de oferecer ao leitor um conhecimento profundo do mundo, tal como faz, por outro caminho, a ciência.

EJA

A Educação de Jovens e Adultos (EJA) deve ser objeto de especial atenção no que toca a políticas e ações ligadas à leitura, considerando-se imperativo criar condições favoráveis de letramento e de acesso ao livro aos jovens e adultos que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio.

Necessidades especiais

O Plano considera fundamental garantir que portadores de necessidades especiais, como as visuais, auditivas e motoras, tenham acesso a livros e outros materiais de leitura, valorizando ações como a versão ou a tradução, em Libras e em braile das obras em circulação, permitindo a inclusão desses potenciais leitores nas escolas regulares.

Meios educativos

O Plano defende a produção de meios educativos (livros, periódicos e demais materiais de leitura a ser utilizados como instrumentos para a educação na escola), tal como vem fazendo o MEC, a fim de assegurar o acesso a bens culturais produzidos em diferentes linguagens, em diferentes suportes, sobre temas diversificados, gerados em diferentes contextos culturais, para leitores de diferentes modalidades e de idades variadas, não só estudantes, mas também professores, bibliotecários e demais membros da comunidade escolar.

Estado da questão

Políticas públicas para as áreas da leitura, do livro, da biblioteca, da formação de mediadores e da literatura devem ter como ponto de partida o conhecimento e a valorização do vasto repertório de debates, estudos, pesquisas, contribuições diversas e experiências sobre as formas mais efetivas de promover a leitura e o livro e de formar leitores, existentes na esfera municipal, estadual e nacional, implementados tanto pelo Poder Público como pelas organizações da sociedade, atentando-se, ainda, para o contexto internacional, em particular, o ibero-americano.

Políticas públicas

A leitura e a escrita devem ser consideradas base nas políticas públicas de educação e cultura dos governos em todos os seus níveis e modalidade de ensino e de administração, e, junto com o tema das línguas, perpassá-las estruturalmente, tal como proposto no Plano Nacional de Cultura (PNC), elaborado pelo Ministério da Cultura. A consolidação de políticas e programas de fomento à leitura deve ser pensada a curto, médio e longo prazo, com ênfase no caráter permanente.

Integração

O Plano parte do pressuposto de que é fundamental a integração entre o Ministério da Cultura (MinC) e o Ministério da Educação (MEC), demais Ministérios e outras agências públicas federais para otimizar os esforços em prol da leitura e do livro no país. O Plano se integra ao Plano Nacional de Cultura (PNC), como base para o texto do capítulo específico sobre o tema. Da mesma forma, o Plano poderá indicar diretrizes para outros documentos oficiais sobre o tema.

A leitura e o livro

Este Plano procura contemplar, de forma dialética, um processo de dupla face: tanto aquele moldado pelas questões que envolvem a leitura quanto o que se configura pelos problemas relativos à cadeia produtiva do livro, buscando evitar polarizações que a tradição tem revelado inócuas, no que diz respeito aos papéis a ser cumpridos pelo Estado e à dinâmica específica do mercado.

Objetivos e metas

O objetivo central da Política de Estado aqui delineada é o de assegurar e democratizar o acesso à leitura e ao livro a toda a sociedade, com base na compreensão de que a leitura e a escrita são instrumentos indispensáveis na época contemporânea para que o ser humano possa desenvolver plenamente suas capacidades, seja no nível individual, seja no âmbito coletivo. Há a convicção de que somente assim é possível que, na sociedade da informação e do conhecimento, ele exerça de maneira integral seus direitos, participe efetivamente dessa sociedade, melhore seu nível educativo (em amplo sentido), fortaleça os valores democráticos, seja criativo, conheça os valores e modos de pensar de outras pessoas e culturas e tenha acesso às formas mais verticais do conhecimento e à herança cultural da humanidade. Trata-se de intensa valorização dos caminhos abertos ao indivíduo pela cultura escrita, sem que se deixe de reconhecer e se tente apoiar e preservar a cultura oral de nosso povo. Busca-se criar condições necessárias e apontar diretrizes para a execução de políticas, programas, projetos e ações continuadas por parte do Estado em suas diferentes esferas de governo e também por parte das múltiplas organizações da sociedade civil, lastreada em uma visão republicana de promoção da cidadania e inclusão social e segundo estratégias gerais para o desenvolvimento social e de construção de um projeto de Nação que suponha uma organização social mais justa.

São estabelecidos aqui alguns objetivos que devem ser alcançados a curto, médio e em longo prazo:

a)    Formar leitores, buscando de maneira continuada substantivo aumento do índice nacional de leitura (número de livros lidos por habitante/ano) em todas as faixas etárias e do nível qualitativo das leituras realizadas;
b)    implantação de biblioteca em todos os municípios do país (em até 2 anos);
c)    realização bienal de pesquisa nacional sobre leitura;
d)    implementação e fomento de núcleos voltados a pesquisas, estudos e indicadores nas áreas da leitura e do livro em universidades e outros centros;
e)    concessão de prêmio anual de reconhecimento a projetos e ações de fomento e estímulo às práticas sociais de leitura;
f)     expansão permanente do número de salas de leitura e ambientes diversificados voltados à leitura;
g)    identificação e cadastro contínuos das ações de fomento à leitura em curso no país;
h)    identificação e cadastro contínuos dos pontos de vendas de livros e outros materiais impressos não periódicos;
i)      elevação significativa do índice de empréstimos de livro em biblioteca (sobre o total de livros lidos no país);
j)      aumento do número de títulos editados e exemplares impressos no país;
k)    elevação do número de livrarias do país;
l)      aumento da exportação de livros; expansão do número de autores brasileiros traduzidos no exterior;
m)  aumento do índice per capita de livros não-didáticos adquiridos; ampliação do índice de pessoas acima de 14 anos, com o hábito de leitura que possuam ao menos 10 livros em casa;
n)    estimular a criação de planos estaduais e municipais de leitura (em até 3 anos),
o)    apoiar o debate e a utilização de copyrigths não-restritivos (copyleft e creative commons), equilibrando direito de autor com direitos de acesso à cultura escrita.[1]




[1]Texto retirado do Plano Nacional de Livro e Leitura - PNLL

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